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sexta-feira, 24 de novembro de 2017

24.- Topônimos e gentílicos


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Reconheço que, ao invés de fazer uma blogada asséptica como a que está a seguir, deveria me manifestar, (como algumas instituições vêm fazendo) contra o documento do Banco Mundial “Um Ajuste Justo - Análise da Eficiência e Equidade do Gasto Público no Brasil” que apregoa   o fim do princípio constitucional da gratuidade do ensino nas Instituições de Ensino Superior públicas, sob o argumento falacioso de diminuição das desigualdades, facilmente desmistificado pela observação do aprofundamento histórico das desigualdades na educação superior nos países onde este ensino é pago— como destaca o Conselho Universitário da UFRJ.
As recomendações ignoram as elevadas contribuições das universidades públicas para o desenvolvimento sócio-cultural do país, para o conhecimento científico, tecnológico, artístico e cultural como um direito humano fundamental e, ainda, que os direitos sociais consagrados na Constituição Federal não são responsáveis pelos problemas fiscais. O Brasil possui inaceitável estrutura tributária regressiva, segue pagando juros e serviços da dívida nunca auditada, conforme estabelecido pela Constituição Federal, promove sistemática renúncia fiscal para os grandes grupos econômicos e não realiza a efetiva tributação sobre a renda, a propriedade e a herança. e

É uma semana quase exótica, pois sem viagens. Em compensação na próxima uma viagem se transformará em duas. Vou a Goiás e daí a Paraíba. Este retorno ao Nordeste, onde estive na semana que passou, esteirou o assunto desta blogada acerca de topônimos e gentílicos, já assuntados na semana que passou.
Salvo equívoco, dentre os topônimos dos 27 estados e de suas 27 capitais apenas um dos estados e quatro de capitais são homenagens a pessoas. Assim, na próxima semana vou a um estado cuja capital não apenas tem nome de pessoa (como a capital do Acre), mas de Pessoa, como João Pessoa, a capital da Paraíba, onde volto depois de muitos anos.
Rigorosamente a capital do Acre é parte do nome de título dado a José Maria da Silva Paranhos Júnior, Barão do Rio Branco (1845 —1912), foi um advogado, diplomata, geógrafo e historiador brasileiro. É considerado o patrono da diplomacia brasileiro e teve papel importante na incorporação do Acre ao Brasil, quando da questão do Brasil com a Bolívia.
Outra homenagem a pessoa está na capital do Piauí: Teresina que remete a imperatriz Teresa Cristina Maria de Bourbon, que teria intermediado com o imperador Dom Pedro II a ideia de mudança da capital, e em sua homenagem deu-se o nome de Teresina, contração das palavras Teresa e Cristina.
A quarta cidade brasileira com topônimo homenageando pessoas é Florianópolis. Inicialmente Ilha de Santa Catarina depois convertida em Nossa Senhora do Desterro teve o nome simplificado para Desterro, com desagrado da população que propôs "Ondina", nome de uma deusa da mitologia que protege os mares. Descartado este nome em 1894 se quis fazer uma homenagem ao então presidente da República Floriano Peixoto, mudando o nome para Florianópolis. A escolha do nome foi, contudo, uma afronta à própria população desterrense, dado que Desterro era uma cidade fortemente monarquista e contrária à Proclamação da República. 
A redução do nome Florianópolis para Floripa não apenas uma corruptela do nome oficial, mas um continuado protesto contra a imposição de um nome oficial que desagrada aos moradores da dita ‘Ilha da Magia’.
O topônimo do único estado Brasileiro que homenageia pessoa é Rondônia (estou excluindo, por razões obvias São Paulo e sua capital). O antigo Território do Guaporé, assim designado em virtude do Rio Guaporé, fronteira natural entre Brasil e Bolívia, quando 1982, ao receber o status de Unidade federativa, recebeu o nome de Rondônia em homenagem a Cândido Mariano da Silva Rondon (1865 – 1958) mais conhecido como Marechal Rondon (título honorífico concedido pelo Congresso Nacional ao completar 90 anos foi um militar e sertanista brasileiro.
O Marechal Rondon deve ser um dos brasileiros mais homenageados com mais topônimos: um município no Paraná, uma das principais cidades (Rondonópolis) no seu estado natal Mato Grosso, ainda dois aeroportos, uma rodovia, bairros, logradouros etc.
a herança

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

17.- Um tríduo soteropolitano


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Inauguro esta edição comentando um gentílico que se afigura como exótico, senão pernóstico. Ele está na chamada desta edição. O Priberam dicionariza so·te·ro·po·li·ta·no :
(Soterópoli[s].topônimo [nome helenizado da cidade de Salvador] + -ense)
adjetivo de dois gêneros
1. Relativo à cidade de Salvador, capital do estado brasileiro da .Bahia.
substantivo de dois gêneros
2. Natural ou habitante de Salvador.
O exotismo parece se evidenciar em sua origem na helenização (= tornar-se conforme ao caráter grego) do nome do município de Salvador, capital da Bahia para Soterópolis (cidade de Salvador), a partir da união de "σωτήρ" (transliteração: sōtēr, -os) que significa ‘salvador’ e "πόλις" (transliteração: pólis) cidade, ambos do grego antigo. O segundo polis (cidade, em língua grega) faz parte como topônimo de centenas de cidades brasileiras: Petrópolis, Teresópolis, Ilópolis... cidade de Pedro; cidade de Teresa; cidade da erva-mate Ilex paraguariensis (nome científico da erva-mate).
O esnobismo do gentílico se expande quando se observa que em sua bandeira há uma pomba com um ramo de oliveira e o lema em latim é: “Sic illa ad arcam reversa est" que faz alusão à narrativa do Gêneses, quando Noé recebe a mensagem que as águas do dilúvio baixaram: "Assim ela voltou à arca."
Depois deste extenso e erudito preâmbulo não preciso dizer que estou em Salvador — a histórica capital da Bahia — ou melhor em Soterópolis, a Cidade do Salvador. Cheguei, no começo da tarde desta terça-feira, à cidade fundada em 1549 por Tomé de Sousa como São Salvador da Bahia de Todos os Santos como primeira capital, quando da implantação do Governo-Geral do Brasil pelo Império Português, partir do marco da fundação da cidade, no Forte (de Santo Antônio) da Barra.
A primeira capital do Brasil é notável em todo o país — e também no exterior — pela sua gastronomia, música, carnavais e arquitetura.
A influência africana em muitos aspectos culturais da cidade a torna o centro da cultura afro-brasileira. Por tal recebeu epítetos como ‘Roma Negra’ e ‘Meca da Negritude’, por ser uma metrópole com uma percentagem grande de negros. Segundo dados de 2014, cerca de 82% da população de Salvador se declarou negra. A foto, onde estou com oito alunas do curso de Química da Universidade do Estado da Bahia (UNEB -campus de Salvador) é uma amostra do perfil do alunado:' mulheres negras'.  Esta é uma realidade que Sul branco, por exemplo, não conhece.
De acordo com a Wikipédia, o antropólogo Vivaldo da Costa Lima diz que a expressão "Roma Negra" é uma derivação de "Roma Africana", cunhada por Mãe Aninha, fundadora do Ilê Axé Opó Afonjá. Nos anos 1940, Mãe Aninha dizia que, assim como Roma é o centro do catolicismo, Salvador seria o centro do culto aos orixás.
O Centro Histórico de Salvador, iconizado na região do Pelourinho, é conhecido pela sua arquitetura colonial portuguesa com monumentos históricos que datam do século XVII até o início do século XX, tendo sido declarado como Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) em 1985. Palco de um dos maiores carnavais do mundo (maior festa de rua do mundo segundo o Guiness Book, também por isso Salvador é conhecida como "Capital da Alegria".
Meus colegas baianos foram generosos no oferecer-me experenciar a linda capital. Na quinta-feira, a Carmen e a Tatiana me levaram ao centro histórico. Parece não existir cidade brasileira com tantos atrativos como Salvador. O que vi na ‘hora do almoço’ cobriria parágrafos: passarelas do carnaval, praça Castro Alves, elevador Lacerda, dezenas de igrejas, Pelourinho onde brindaram-me com almoço no Museu Culinário do SESC com quarenta pratos diferentes. À noite nova vivência culinária exótica: a Sílvia, Rodnei e Saulo ofereceram uma rabada, algo inédito para mim.
Mas, eu não vim a turismo — mesmo que afortunadamente sempre se dê ‘roubadinhas’ e se encontre sumarentos momentos de lazer — mas para participar do XII EDUQUI Encontro de Educação Química da Bahia que nesta edição tem como mote Licenciatura em Química: Estagnação, Extinção ou Ressignificação? Recordo já ter participado de pelo menos três EDUQUIs em 2003 em Ilhéus, 2005 em Jequié e 2012 em Salvador. Na edição deste ano a Universidade do Estado da Bahia é a anfitriã.
Na manhã de quarta-feira fiz a palestra inaugural “Das disciplinas à indisciplina”. Aditei ao meu já usual ‘fora temer’ minha preocupação por ter visto naquela manhã, em um prédio do Exército duas imensas faixas com escritos algo similares a “Chega de corrupção! queremos que os militares assumam o poder”. Há temeridade nestes tempos temerosos.
Nas noites de quarta e quinta feiras ministrei oficina acerca da “História da Ciência catalisando à indisciplinaridade” para 25 professores e alunos. Agradou-me muito a atividade.
Nesta sexta-feira retorno a Porto Alegre já pensando em reencontros com muitos parceiros no fazer Educação. Alguns em Goiânia em janeiro no Eduquim e outros no Eneq em Rio Branco em julho.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

10.- Três dias na Noiva do Mar



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Esta edição ocorre quando retorno de três dias sumarentos em Rio Grande, onde participei de dois eventos. Parti às 22h de sexta-feira, com horário de chegada previsto em Porto Alegre às 03h. Na quarta-feira, cheguei à Universidade Federal de Rio Grande (FURG) conduzido pelo meu atencioso colega Guy Barros Barcellos. À tarde, fiz a palestra de encerramento do IV Fórum Acadêmico Integrado de Química — IV FAIQ. À noite participei de uma confraternização na residência de Maria do Carmo e Manoel no balneário Cassino.
A quinta e sexta-feira foram os dias do 37º Encontro de Debates sobre o Ensino de Química — 37EDEQ — onde ministrei um minicurso e participei uma mesa-redonda.
No Brasil não são muitos eventos que atingem uma realização sequencial com um número tão significativo de edições. E, a esta constatação, adito outra informação que penso bastante rara: estive em todas as 37 edições (no 16EDEQ, em 1996 na Universidade de Santa Cruz, envolvi-me na organização do evento, mas não pude estar ao vivo, por ter feito uma cirurgia na tíbia e na fíbula; enviei mensagem que foi lida pelo meu amigo Edni).
Parece, até para preservação de memórias, algo da gênese do evento, que é importante narrar aqui e agora nosso começo. A Sociedade Brasileira de Química é fundada em São Paulo, em 1978, também para ser alternativa à Associação Brasileira de Química, por demais integrada à matriz da produção da Química industrial. Espaços ficam naturalmente delimitados:  ABQ no mundo da produção industrial (a fábrica); SBQ no mundo da produção acadêmica (a universidade).
Em 1980, se estabelece em Porto Alegre uma regional da SBQ. Ocupo o cargo de secretário regional do RS e para dar visibilidade à novel Secretária Regional da nova entidade, organizo junto com Maurivan, um primeiro EDEQ, que ocorreu em 6 de dezembro, na PUC de Porto Alegre.
Reunimos, então uma centena de professores de Química, dos três graus de ensino, para discutir: “As inter-relações do ensino da Química nas diferentes etapas da escolarização, bem como as interações dos pesquisadores com o ensino”. Estava dada a partida não apenas a realização dos EDEQs mas se lançava sementes para realização de outros eventos regionais (pois o EDEQ, mesmo que não apareça no nome é um encontro gaúcho acerca de ensino de Química) e também Encontro Nacional de Ensino de Química (ENEQ) que são encontros nacionais bianuais, cuja primeira edição foi na UNICAMP em 1982. Há significativas produções por exemplo no VII ENEQ na UFMG, em 1994, quando surgiu a revista Química Nova na Escola.
Em quase 40 anos, houve apenas uma lacuna: em 1991 quando estava programado o XII EDEQ na cidade de Pelotas, assumido pela UCPEL e pela SMED de Pelotas. Houve uma série de tratativas como estabelecimento do programa, convite a palestrantes etc, mas por problemas locais foi quebrada uma tradição ininterrupta, então de 11 anos.
Reviver, neste singelo relato o peregrinar em quase duas dezenas de universidades gaúchas e uma escola técnica embalou saudades. Parece que se pode dizer que o EDEQ que a cada ano reúne centenas de educadores gaúchos incomodados — os acomodados nunca vêm aos EDEQs — com suas ações enquanto profissionais contribuído para a melhoria da Educação gaúcha.
Coube-me a honra se encerrar o evento; disse: ‘Vemo-nos na Ulbra em Canoas em outubro de 2018 no 38 EDEQ!’
Um último, mas importante destaque, talvez cerca de dois terço dos quase meio milhar de participante do 37EDEQ eram jovens alunos de licenciaturas e mestrandos e doutorandos.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

03,- Quinhentos anos da REFORMA LUTERANA


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Anunciara, ao encerrar última edição deste blogue, que inauguraria as blogadas de novembro com referências ao 5º Centenário Reforma Luterana ocorrido no último dia 31 de outubro. As mídias sociais parecem ter dado pouco destaque ao evento. Por exemplo, a Rádio Vaticana (no programa brasileiro) só comentou a efeméride no dia seguinte.
Na manhã desta sexta-feira foi muito significativo ouvir a Joana Martins Apolinário, no encanto de seus quase 8 anos, falar-me dos feitos de Lutero. Dedico a ela este blogue, produzido a partir do capítulo Escola e Universidade, p. 155-187 do ‘Das disciplinas à indisciplina
Há quando se quer definir o início dos tempos modernos há propostas de eventos, que decretaram modificações significativas na Europa, que podem marcar o fim da Idade Média. Assim, para o seu término são propostos os seguintes eventos (aqui citados em ordem cronológica): 1439: invenção da imprensa // 1453: queda de Constantinopla // 1453: fim da Guerra dos 100 anos // 1492: descoberta da América// 1517: Reforma Luterana // 1534: Reforma Anglicana.
Mesmo que eu não seja historiador, se tivesse de eleger um, a minha escolha seria, para o mais significativo, a Reforma Luterana, desencadeada por Lutero*, talvez marcado pelo meu viés dito ‘igrejeiro’, (leia-se querer ler a história marcada de maneira significativa pela presença da religião). Se fosse eleger outro, seria a invenção da imprensa, reconhecendo-a tão importante, quanto o invento da Internet, talvez, a criação mais revolucionária do Século 20.
Esta blogada não dá conta no destacar as muitas consequências políticas, sociais, econômicas, culturais e educacionais advindas de diferentes cisões no até então quase monolítico domínio da igreja católica romana. Destas cisões são relevantes as consequências da Reforma Luterana. Talvez um dos feitos mais significativos de Lutero foi traduzir toda Bíblia para o alemão, em uma edição de 1534. Antes houve outras traduções parciais (especialmente dos evangelhos) em diferentes idiomas.
A Bíblia de Lutero se torna referência na manutenção da ortodoxia nas igrejas reformada. Ela confere ao alemão o status de língua culta e com isso fortalece o emergente conceito de ‘Estado nação’. Há quem mostre que a língua alemã e mesmo a Alemanha tenham como uma das geratrizes a Bíblia traduzida por Lutero.
Importância mais significativa desta tradução foi que então a Bíblia estava acessível a todos (que soubessem ler). Aqui, vale destacar uma ação muito significativa: Lutero para a facilitação da tradução fez incursões nas cidades próximas para ouvir como falavam as pessoas nos portos e mercados. Ele queria garantir que sua tradução fosse a mais próxima possível da linguagem contemporânea. A tradução de toda a Bíblia para outras línguas (nos anos seguintes surgiram edições em francês, espanhol, tcheco, inglês, neerlandês) foi considerada um divisor de águas na história intelectual da Humanidade.
Os cultos nas igrejas reformadas passaram a ser em vernáculo**, pois além da Bíblia, os hinos foram traduzidos (ou produzidos) na língua local. Ocorre que essa inovação não pode ser fruída pela população, que era em sua maioria analfabeta. Foram criadas, então, escolas junto a cada igreja reformada para se ensinar a leitura, assim o povo poderia ler a Bíblia e ler os hinos nos cultos.
Na educação, o pensamento de Lutero produziu uma reforma global do sistema de ensino alemão, que inaugurou a escola moderna. Seus reflexos se estenderam pelo Ocidente e chegam aos dias de hoje.
A ideia da escola pública e para todos, organizada em três grandes ciclos (fundamental, médio e superior) e voltada para o saber útil nasce do projeto educacional de Lutero. “A distinção clara entre a esfera espiritual e as coisas do mundo propiciou um avanço para o conhecimento e o exercício funcional das coisas práticas”.
Tão importante quanto Lutero para a educação foi Philipp Melanchthon (1497-1560). Durante o período que Lutero passou impedido de se manifestar publicamente, Melanchthon foi o porta-voz da causa reformista e se encarregou de reorganizar as igrejas dos principados que aderiram ao luteranismo. Esse trabalho resultou no projeto de criação de um sistema de escolas públicas, depois copiado em quase toda a Alemanha. A reforma da instrução era uma das principais reivindicações das camadas mais pobres da população, insatisfeitas com as más condições de vida e com o ensino escasso e ineficaz oferecido pela Igreja. Esses foram alguns dos motivos da revolta armada dos camponeses, sangrentamente reprimida em 1525.
Melanchthon e Lutero viam na educação um assunto do interesse dos governantes. “A maior força de uma cidade é ter muitos cidadãos instruídos”, escreveu Lutero. Para isso, foi criado um sistema que atendia à finalidade de preparar para o trabalho e à possibilidade de prosseguir os estudos para elevação cultural. O currículo era baseado nas ciências humanas, com ênfase na história.
Paradoxalmente, a Reforma Luterana é muito benéfica à igreja romana, pois com a contrarreforma há uma refontização, na busca das verdades e das práticas que haviam sido perdidas.
Assim a Escola como conhecemos hoje é produto da Reforma Protestante. A primeira ordem religiosa ensinante da igreja romana (antes as ordens religiosas são pregadoras, esmolantes, orantes, hospitalares, militares...) é a Companhia de Jesus (jesuítas) fundada por Inácio de Loyola em 1531, quase 15 anos depois do histórico 31 de outubro de 1517, quando foram afixadas as 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg.
Claro que não se desconhece que, na Idade Média, particularmente a partir do momento que a Igreja cristã, com Constantino, no século 4º, se faz hegemônica no Império Romano (e este é apenas o mundo do qual sabemos falar) havia escolas e essas se confundem com as ações de educação da igreja. Todavia, é preciso reconhecer que essas escolas (anteriores à Reforma e à Contrarreforma) não eram destinadas a todos, mas apenas as elites. Estas podiam ter tutores para ensinar seus filhos. Também os aspirantes a ordens religiosas tinham o acesso a Escolas de maneira mais privilegiada que a população em geral.
Em síntese, podemos dizer que a Escola, no modelo que temos hoje — muito especialmente na sua dimensão de acesso a todos — é um legado da Reforma Luterana, na inauguração da modernidade. Acrescente-se que esta Escola vem ferreteada com as marcas do dogmatismo herdado da igreja que foi sua geratriz.
Talvez outra dádiva da reforma foi fazer a igreja abandonar muito de suas posturas monacais e assumir-se mais inserta no mundo, preocupada com a realidade terrena, e não sonhar expectante com a futura vida celestial. Há quem possa ler de maneira oposta esse comentário. Foi dádiva? Ou foi perda?
* Martinho Lutero (Eisleben, norte da Alemanha, 1483-1546). Em família estava destinado a seguir a carreira jurídica. Seguindo os desejos maternos, inscreveu-se na escola de direito da universidade de Erfurt. Mas tudo mudou após uma grande tempestade com descargas elétricas, ocorrida em 1505: um raio caiu próximo de onde ele estava passando, ao voltar de uma visita à casa dos pais. Aterrorizado, teria, então, gritado: "Ajuda-me, Sant'Ana! Eu me tornarei um monge!" Tendo sobrevivido aos raios, deixou a faculdade, vendeu todos os seus livros, com exceção dos de Virgílio, e entrou para a ordem dos Agostinianos, de Frankfurt, a 17 de julho de 1505. Aos 25 anos, foi para a Universidade de Wittenberg, onde se formou em estudos bíblicos. Uma viagem à Roma se torna decisiva em sua vida: escandaliza-se com o comportamento do clero. Ao voltar, iniciou carreira de professor e pregador. Segundo a tradição, em 31 de outubro de 1517 foram afixadas as 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg. Essas teses condenavam o que Lutero acreditava ser a avareza e o paganismo na Igreja como um abuso e pediam um debate teológico sobre o que as Indulgências significavam. Para todos os efeitos, contudo, nelas Lutero não questionava diretamente a autoridade do Papa para conceder as tais indulgências. Quatro anos depois foi excomungado pelo papa Leão X e reafirmou suas convicções perante os governantes alemães, na Dieta de Worms (reunião parlamentar), de onde saiu condenado. Após um ano refugiado, sob proteção de amigos, retomou a vida religiosa em Wittenberg. Em 1525, casou-se com a ex-freira Katherina von Bora. Nas duas últimas décadas de vida, ganhou prestígio popular, enquanto o apoio dos governantes variava com as circunstâncias. Morreu durante visita a sua cidade natal. 
** Vernáculo: nome dado à língua nativa de um país ou de uma localidade. Até recentemente (anos 50 do século 20), estudos científicos, filosóficos ou religiosos publicados na Europa eram em sua maioria escritos em latim. Já os trabalhos escritos em uma língua local, como o italiano, o espanhol ou o alemão eram denominados de escritos em vernáculo. Pode-se referir a uma língua vernacular em contraste à língua litúrgica. Por exemplo, a igreja católica romana manteve todas suas celebrações litúrgicas em latim até o Concílio Vaticano 2º (1962-65).